15/11/2008
Adormeceu com os ruídos da noite paulistana. Ainda no segundo andar podia ouvir um meio salto rastejando pelas ruas do Centro da cidade, pneus queimando canções pelo asfalto, garrafas ensaiando ballet em uma disputa entre cavalheiros. Esta era a canção de ninar que o embalava todas as noites. Adormeceu assim: com sua orelha direita queimando na coxa esquerda daquela mulher. Seu nariz roçava o vão daquela virilha feminina. Adormeceu e, em seus sonhos, o cotidiano. Em algumas noites gostava de dormir com meias. Mesmo no verão, usava edredon. Fazia bolhinhas de sabão com o xampu. Lia dicionário no banheiro. Guardava seu bombom preferido para o final. Comia massa de bolo crua. Andava nu pela casa recitando Drummond. Escondia seus CDs do Roberto Carlos. Deixava a barba crescer bastante só para ter o prazer de arrancá-la e sentir-se outro homem. Entre vigília e sono, acordou com o barulho do escapamento de um ônibus cuspidor de diesel. Entre coxas, não hesitou. Fitou a pele morena magenta e sacudiu a mulher em seu leito.
- Clarice, acorde! Tenho algo importante a dizer. – murmurou.
Espreguiçando-se, ainda sonolenta, Clarice levantou a cabeça e parte do tronco de modo a apoiar seus cotovelos sobre a cama. Ele continuou entre coxas apoiando as mãos no queixo.
- Case-se comigo. – ele perguntou.
- Eu aceito com algumas condições: nada de igreja, véu, grinalda, festa, família, presentes, padrinhos, bolo com dois andares, chá de cozinha ou união civil. Nada disso. Continuemos assim: cada um em seu apartamento com camas compartilhadas.
Nesse momento, ele percebeu que era o homem mais feliz do mundo, mesmo anônimo. Novamente, adormeceu. Desta vez, sobre o ventre.
sábado, 15 de novembro de 2008
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Um comentário:
O importante é compartilhar. Sempre. Recebi o convite para conhecer seu blog em meu email e não pude recusar tal proposta. Ainda bem. Abraços meus e boa semana
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