quarta-feira, 26 de março de 2008

Minha tristeza pé no chão

Minha tristeza pé no chão

“Não creio em santos e poetas. Perguntei tanto e ninguém nunca respondeu”, Zeca Baleiro

Camila Marins – 26/03/2008

Lembro-me dos meus primeiros livros. Nós vivíamos reclusas em um condomínio de prédios em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, onde morei por mais de 12 anos. Por insegurança ou talvez segurança de nossos pais, eu e minhas irmãs brincávamos muito no apartamento. Sempre achei bonecas um saco. A única que eu gostava era uma boneca negra gorduchinha de roupinha verde (aff, quantos diminutivos). Mergulhava na leitura e meus pais nos influenciavam para tal. Lembro-me de dois livros que marcaram bastante: “O velho e o mar” (Ernest Hemingway) e o “Diário de Anne Frank”. Li esses dois livros antes de mudar-me para Minas Gerais, ou seja, antes de completar 13 anos.

Hoje bateu uma sensação infantil. Uma sensação do pescador de Hemingway. Uma sensação do quarto de Anne Frank. Olho para os lados e vejo a imensidão. Grito por socorro e apenas ouço o eco de minha voz. Tateio o ar ensaiando coreografias frívolas com minha sombra. Pausa. Olho para meus livros, meus CDs e a mesa do computador de onde escrevo. Um saci ao lado do Graciliano Ramos, uma boneca boliviana ao lado de Bhagavad Gita e um Cristo Redentor ao lado de uma Patchamama. Nada faz sentido. Uma figura importante nesse processo melancólico tem sido o Zeca. Pois é. Ele mesmo. Ao mesmo tempo, o Zeca tem se tornado motivo de preocupação. Quando ele aparece significa rememorar alguns versos de Clarice Lispector. “Viver é um luxo. Pronto. Passou”. Meu choro desafina qualquer viola. Lembrei-me de Clara Nunes: “Molhei o pano da cuíca com as minhas lágrimas”. Muitas vezes parece incontrolável. Haja pulmão! Cada vez sufoco mais. Sinto-me estrangulada pelo mundo. Nem minha arte me salva ou talvez ela seja minha redentora. Rezo ao Saci. GRITO por misericórdia, mas a dor continua e meus joelhos continuam esfacelados. Há dias que a dor é incontrolável. Ah Zeca, mostre-me flores no asfalto. Recite-me versos perdidos. Olho para o lado e caio. Caio em um abismo que cavo com meus pés. Salve Ney Matogrosso! Botecos e cigarros não satisfazem. Preciso de idéias, de semelhantes, de afins. Preciso de esperança! Ah, meu Zeca! Meu Zeca Baleiro que embala sonhos. Fazei com que as pessoas sejam embaladas pela mesma melodia. Pela melodia da solidariedade. Embala... embala... embala...

sexta-feira, 21 de março de 2008

Silêncio

Silêncio

Camila Marins - 03/04/2007

Me sobraram apenas aqueles últimos
três minutos.
Nas últimas.

Um assobio vem
a sussurrar no vácuo
a esquentar meu tímpano.
Órbitas sibilantes entre pêlos.

Quase explode.
Mas não!

Somente línguas febris
embalam esse discurso.
Único
Simplesmente,
monocórdico?

E é claro! Sim!
sua face descoberta
entre rochedos e mares
algo resta.
segundo.

E no timbre de sua mudez
regresso
reclusa nesta sarabanda.

domingo, 16 de março de 2008

Redundância Pertinente


Redundância pertinente

Camila Marins – 16/03/2008

Talvez panfletário, certamente redundante. Talvez essa seja a possível definição para esse texto que pretendo lhes apresentar. O tema é bastante comum em meus escritos. Hoje, um domingo de ressaca, um bom dia de pijama, estava eu sapeando alguns canais na TV quando deparo-me com o documentário “Preto e Branco”, no Canal Brasil. Uma película que discute a questão racial no Brasil. Capa da Veja: “O sucesso dos vencedores”, advogado, ex-presidente de uma multinacional francesa e negro. Esse é o perfil de uma das fontes apresentadas no documentário que afirma o seguinte: “Não acredito que exista preconceito racial no Brasil. Uma única vez, entrei com o carro na contramão, os policiais me pararam e recebi um tratamento muito bom”. Outra cena interessantíssima é o almoço em família. Os filhos discutindo a questão racial e o preconceito. A filha diz: “Eu me sinto incomodada quando entramos em um restaurante chic e todos nos olham”. O pai, ignorando o preconceito, responde: “Não, minha filha, não é preconceito. As pessoas vão a restaurantes para serem vistas”. Ela discorda e reafirma: “Meus amigos só aceitam porque convivem conosco desde criança”. O pai discorda veementemente da filha e acha que é coisa da cabeça dela. Algumas outras fontes apontaram que não é a questão racial no Brasil e sim o debate de classes. Pergunto-lhes: quem é a população pobre? Quem é a maioria? Senhoras e senhores. Companheiras e companheiros. Bem-vindos à realidade. São os negros! Mesmo diante deste fato, não dá para ignorar a discriminação RACIAL! Em todas as escolas que estudei e até mesmo na faculdade, sempre fui a mais “escura” entre os colegas, mesmo me declarando negra. Nem professores, diretores ou alunos negros, apenas faxineiros, motoristas, cozinheiros. Mudei de escola umas 3 vezes, por mudança de cidade, e o preconceito é realmente perceptível. Não adianta declarar que não é preconceituoso se, por ventura, a pessoa se surpreende com a presença de negros em instituições de ensino ou no trabalho. Geralmente, existe uma ‘concessão’ para tal, ou seja, se a negra ou o negro possuírem certa legitimidade na sociedade serão aceitos e essa pseudo-aceitação declara o preconceito velado. Essa legitimidade atribuo a alguns fatores, tais como: poder aquisitivo, status social, tradição da família, prêmios, certos méritos, entre outros. A questão racial só é ‘aceita’ a partir desses fatores, porque, infelizmente, o preconceito existe e há um vício sintomático da população em velá-lo. Os fatos estão aí: quantas mulheres negras recebem atendimento médico adequado? A maioria delas mal são tocadas. Quantos negros são revistados violentamente por policiais todos os dias? Quantos negros estão na universidade? Quantos negros estão na política? Quantos negros estão no comando de empresas? Defendo o sistema de cotas na universidade como medida inicial. No entanto, é preciso investimento em políticas públicas sérias que realmente atendam ao negro. Não podemos negar esse velo do preconceito, é preciso discutir e debater com a sociedade. A negação, neste caso, é muito perigosa, pois pode ser precedente para assassinatos, espancamentos e exclusões. Ontem à noite estive em uma festa de formatura e contei no dedo os negros ali presentes. Quando fui ao banheiro, quem estava lá limpando? Uma negra! Uma negra pedindo, discretamente, que levássemos alguns salgadinhos para ela comer, enquanto ela limpava os papéis higiênicos sujos desse ‘evento burguês’ que reafirma a exclusão. Por mais que esse tema pareça redundante em minhas discussões, acredito que precisamos debater até que haja conscientização. Hoje, a ressaca bateu, o tempo fechou, a redundância continuou a me incomodar...

Alma não tem cor - Karnak

Alma não tem cor
Porque eu sou branco
Alma não tem cor
Porque eu sou negro
Branquinho, neguinho
Branco, negon
Alma não tem cor
Porque eu sou branco
Alma não tem cor
Porque eu sou jorge mautner
Percebam que a alma não tem cor
Ela écolorida
Ela é multicolor
Azul, amarelo, verde, verdinho, marrom
Cê conhece tudo, cê conhece o reggae
Cê conhece tudo né, cê só não se conhece


sábado, 15 de março de 2008

Nós


Nós


nós
eu como você
você como eu
nós

emaranhados em teias
mais traiçoeiras que nós
nós difíceis de desatar

nós
eu como você
você como eu
nós

circula em minhas veias
mais mel que qualquer colméia
lhe entrego meu favo, Baco

nós
eu como você
você como eu
nós

corações apertados
nós entrelaçados
amarrados em fios

nós

um dia
apaixonados por um fio


Camila Marins 15/08/2007 -

poema antigo sobre "amores" antigos, graças aos Céus e ao Roberto Carlos tudo passou....
Ah! Não posso esquecer da maior abelha rainha: Maria Bethânia! Saravá!

sexta-feira, 7 de março de 2008

O verbo antecede o pronome



O verbo antecede o pronome

Ao som de: “O mundo caquinho de vidro
Tá cego do olho, tá surdo do ouvido
O mundo tá muito doente
O homem que mata, o homem que mente” – Karnak


Camila Marins – 07/03/2008

Ouvindo essa música abro meus e-mails. Uma dessas noites melancólicas, deparo-me com um e-mail que fez-me chorar. Fez-me. O verbo antecede o pronome neste caso. Sim o eu vem depois da ação. Algo que me move. Esse e-mail confortou-me. “O povo latino-americano é bom e é revolucionário. Creio que, aos poucos, estamos progredindo em direção ao socialismo”. Essas foi apenas uma das frases que confortou-me. Enquanto isso, vejo na TV a crise andina. A Colômbia ignora o direito internacional, as fronteiras e qualquer relação diplomática e EXECUTA Raul Reyes de maneira lamentável. Isso faz-me lembrar meu comandante Che Guevara. Nos últimos anos, o socialismo tem avançado nos países da América Latina. Cuba não tornou-se um caso isolado e as forças revolucionárias ganham cada vez mais força. Por outro lado, os EUA financiam a Colômbia, assim como armamento e exército. Qualquer semelhança, mera coincidência. Meras. Meras. Meras. Que merda. Será que os EUA subestimam tanto assim o povo latino-americano?? Está claro que trata-se de um sinal estadunidense a fim de conter o socialismo que avança pelos países. O ataque da Colômbia significa apenas uma desculpa para uma tentativa de derrubada do Chavez e, possivelmente, do Evo e Rafael Correa. E é claro para a tomada do Brasil, porque uma guerra, no atual momento, será o estopim para a internacionalização da Amazônia. Urge o tempo da aurora. Uma aurora vermelha. Uma aurora que não é movida. Uma aurora que move os povos. Uma aurora que antecede a chegada de novos tempos. Uma aurora socialista. É chegada a hora de aposentar meu óculos, as letras, os CDs, os livros, os autores, a depressão, a miséria existencial. É chegada a hora. Organizar para resistir! Revolução já! “Pátria livre, venceremos!” (palavra de ordem do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST).

quarta-feira, 5 de março de 2008

Vidas secas e uma aurora vermelha


Vidas secas e uma aurora vermelha


01/03/2008 – Camila Marins

Olhos lânguidos na planície avermelhada
testas franzidas e beiços voluptuosos
não! não sabia
não! não enxergava
pés calejados neste chão duro e desigual
nada mudava
e aquela planície avermelhada insistia
planície que estrangulava
aqueles homens que morriam de sede
não! não havia brilho
aquele sol castigava mais que qualquer inferno de Dante
não! não havia brilho
apenas pés calejados neste chão duro e desigual
aquelas mulheres, aqueles homens e aquelas crianças
nunca viram o brilho de uma aurora
o sol sempre esteve ali
chicoteando aqueles pés
apenas um par de olhos
ali sim havia um resquício
um par de olhos
esta era a aurora de Fabiano

e os teus olhos? Ainda brilham?
Sonham!