- 9/2/2014
O apartamento fervia entre quatro espremidas paredes. Andava de um lado
para o outro lutando contra sua teimosa ebriedade. Era uma quarta-feira
e tinha uma agenda cheia pela frente: reunião
antes do trabalho; trabalho; 11 textos pela frente; metade de um livro
para terminar; pilates, duas reuniões mais e dezenas de diálogos pobres
para enfrentar. Em mente: férias em algumas semanas. Enquanto isso, o
apartamento a estrangulava; apertava tanto sua jugular que mal
respirava. Principiava exercícios de meditação, embora sua concentração
tenha se tornado mero exercício paradoxal. Contava os quadrados de seu
piso, enquanto cores transversais pintavam suas paredes. O gato
balançava o rabo e comia com garfo e faca um aipo com mostarda preta.
Pensava na quantidade de porra de seu namorado e em quantas mulheres
mais ele andava comendo. Não. Praticava orgias em propagandas de ônibus.
Queria ser motorista. Tomou coragem e desceu para a rua em tentativas
de respiração. Apenas cu. Inspirava e expirava. Procurava Fridas nas
esquinas, e nem sinal de Rivera. Galeto no boteco da esquina e papeação
com vizinho. Cerveja vai, coxinha desce. Asas de frango voam?
- Tudo na vida é obscenidade.
- Não. A família é o berço da perversidade.
- Ei, vocês dois ai, acreditam no toplessaço?
Desce a mulher que senta e entorna o copo. Pergunta para o companheiro:
- Por que eu não posso?
Não só pode, como deve. Em seus deveres de gênero, arrancou a blusa e
ficou ali bebendo cerveja, falando sobre política e surrealismos
baratos. Ainda incitaram a outra mulher a tirar.
- Tirar a blusa é ato político, e não para o seu pau ficar duro, punheteiro de merda.
O bar nega cerveja a essa mesa obscena, lasciva e perversa. Tão
adjetivada como seu Verbo. Caminham pelas ruas da Lapa, entre Ubaldino e
Mem de Sá. Sentam em outro boteco. Homens caralho arrancam gargalhadas e
celulares para fotografar. Em cada uma das mesas, a pergunta traça a
língua:
- Peito tem graça?
Senhoras de meia idade chegam perto da mesa e em toda a solidariedade arrancam a blusa em menos de três segundos.
- Rapidinho, minha filha.
Sorriem diante da rapidinha da Lapa.
domingo, 9 de fevereiro de 2014
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