09/10/2009
E as Olimpíadas abocanharam o Rio de Janeiro. Ou vice-versa. Foi confirmada a vitória da cidade maravilhosa na última sexta-feira, dia 2. Famigerada data que, inclusive, representou um feriado facultativo... Podem acreditar! Além disso, muitos shows e quase um circo. As ruas cariocas estavam empolvorosas, as praias lotadas de expectativa e por que não patriotismo. Pois é, as pessoas torciam fervorosamente apelando a um pseudo patriotismo e nacionalismo.
Confesso: nunca torci pela vitória do Rio de Janeiro! Não tenho dúvida alguma de que realmente sejamos uma cidade maravilhosa, mesmo com tantos problemas. No entanto, ocultá-los, é um erro inadmissível. Em primeiro lugar, o vídeo de defesa da candidatura do Rio de Janeiro é uma farsa! Sim, uma farsa e quase tragédia. Quem assistiu pôde minimamente perceber todo o belíssimo carnaval reproduzido, entre belas praias, paisagens, samba, alegria, sincretismo religioso. Fez-me sentir orgulhosa de ser brasileira, assim como deve ter feito a muitos. Mas, a pergunta que não quer calar: para onde foram as favelas? E os pobres? E a violência? E os policiais com seus fuzis? Em todos os gráficos e mapas, nenhuma favela é mostrada. De repente, sumiram...
Atualmente, o Rio de Janeiro vive uma ostensiva política de violência do Estado. Bastam-me dois exemplos: a operação “Choque de Ordem” e a contenção das favelas por meio de muros. Para quem não sabe “Choque de Ordem” é uma operação cujo principal alvo são os trabalhadores informais, desempregados e sem teto. Digamos que representa uma espécie de higienização da cidade, assim como Pereira Passos fez um dia. E para onde vão esses trabalhadores, sem teto e informais? Ninguém sabe. Ou pior, para outra esquina, desde que seja bem longe da Zona Sul. Esta é a lógica da política implementada pelo governo: a segregação espacial e social.
Seguindo esta lógica, tijolo a tijolo é construído o muro de contenção nas favelas. Sob a desculpa de preservação ambiental, os pobres são cada vez mais isolados e distanciados dos grandes centros. Tapa os olhos, mete cimento e arromba casa. É assim que funciona e tudo isso só começou para fortalecer a candidatura do Rio de Janeiro às Olimpíadas. Imaginem o que vem por aí... Ocupação das favelas, certamente. Mas a que custo? Eis o custo: morte de trabalhadoras e trabalhadores, crianças, violência ininterrupta, milicianos e a continuidade da corrupção.
Enquanto as pessoas sonham com a chegada de 2016, eu tenho pesadelos: se antes era “Choque de Ordem”, agora será “Ordem de Execução”; ou antes “Muros de Contenção das Favelas”, agora “Balas para extermínio das populações periféricas”. Nem aprofundarei muito na questão dos transportes, mas vale a pena citar que apenas setores da elite terão o transporte melhorado, enquanto isso trabalhador continuará sendo chicoteado como animal em jaula nos trens da Supervia. Isso tudo sem contar o lado financeiro: imaginem quantas CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito) teremos? Quanto caixa 2?
Será que nossa cidade maravilhosa se afundará em dívidas, promessas não cumpridas e repressão aos pobres? Agora que a Olimpíada chegou, a denúncia não pode parar!
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4 comentários:
Oi Cami, demorei a comentar porque eu estava no Rio. Aliás, não te liguei porque não deu, fiquei enrolado com vários compromissos pré-marcados. Mas, na impossibilidade de falarmos sobre isso na mesa de um botequim, falemos por aqui mesmo.
Primeiramente, acho que uma das piores contribuições do PSOL para a política foi o agudo pessimismo de seus militantes em relação ao Brasil. Vocês resgataram um dos piores traços dos antigos partidos comunistas que é menosprezar a alegria do povo, tratando-a sempre como alienação.
Fiquei particularmente surpreso com a sua indignação diante da festa que a população carioca armou na praia, do patriotismo que sempre aflora nestes momentos e até do – justíssimo – feriado decretado pelo governador do Rio. Independente do que acontecerá até 2016, a cidade passará por melhorias significativas em sua infraestrutura. Um investimento que dificilmente ocorria de outra forma. Só isto bastaria para justificar a nossa alegria com a escolha do Rio como sede das Olimpíadas.
Mas, além das melhorias que irão beneficiar boa parte da população local, louvamos o fator simbólico de sermos o primeiro país da América Latina a sediar os jogos. É uma vitória política – não de Lula, não do PT, mas do Brasil. É assim que temos de encarar as vitórias políticas que falam diretamente à nossa autoestima: sem partidarismo e cores ideológicas.
Não entendi por que você torceu contra a vitória do Rio. O seu texto não deixa claro e você não explicou a razão, o que me leva a crer que você torceu contra orientada pelas diretrizes do PSOL. Para mim, alguém que joga contra o Brasil, é tão entreguista quanto os velhos reacionários do DEM e do PSDB. Quando se unem para difamar o Brasil, os políticos do PSOL e da direita mais conservadora não diferem em nada.
Quando você diz, por exemplo, que o vídeo da defesa da candidatura do Rio é “uma farsa e quase tragédia”, comete uma análise ingênua. Ora, qualquer cidade do mundo, das mais pobres às mais ricas, exaltariam as suas qualidades e esconderiam os seus problemas numa campanha para sediar os Jogos Olímpicos. Não há nisso nenhum problema.
Como você acha que deveria ser o vídeo da nossa defesa? Deveríamos mostrar policiais agredindo os moradores e turistas sendo assaltados nas praias? Só alguém que quisesse perder a disputa faria uma coisa dessas. No mais, todos sabemos qual é a realidade social do Rio e não é um vídeo promocional que teria a obrigação de denunciar nossas mazelas ao mundo. Seria como pedir que a Heloísa Helena mostrasse, em seu horário político para a campanha presidencial, os assassinatos cometidos no mundo em nome do socialismo.
Não pense com isto que virei a casaca. Continuo sendo socialista, mas um “socialista moreno” (apud Darcy Ribeiro) que acredita no Brasil e no povo brasileiro e tem a certeza de que não podemos implantar aqui um modelo de governo baseado no que diz Marx, ou Lenin, ou Mao Tsé-Tung, ou Fidel Castro etc. O nosso socialismo deve ser original, pois são originais a nossa cultura e a nossa miscigenação. Temos de criar um novo caminho para o Brasil, respeitando o jeito de ser de nossa gente - seu jeito de amar e sofrer, seu jeito de rezar e celebrar a vida, seu jeito de trabalhar e sonhar.
As Olimpíadas não têm a obrigação de resolver o problema do tráfico e das favelas. Por que não podemos cuidar desses problemas e sediar as Olimpíadas mesmo assim? É a mesma coisa que supor que não posso receber os amigos em minha casa só porque ainda estou pagando as prestações da mesma. Se você olhar para trás e ver o que era o Brasil há dez anos atrás, dificilmente deixará de reconhecer que conquistamos muita coisa sob o governo Lula e as Olimpíadas virão para coroar esta fase esplêndida da qual sentiremos saudade um dia. Não se trata de uma defesa pura e simples, já que nem petista eu sou. É apenas questão de bom senso, de observar os fatos à luz da realidade possível e não da realidade inviável que o PSOL quer nos impôr.
Grande beijo!
Poxa, Bruno, pena que essa discussão não tenha sido feita em uma mesa de bar... Fico muito feliz com seus comentários, pois enriquecem o debate. Vamos lá: minha crítica não é baseada em influências ou direcionamentos partidários, de modo algum. Minha crítica vem do cotidiano, de quando subo uma favela e vejo casa de trabalhadores arrombadas pela polícia ou milicianos extorquirem dinheiro destes mesmos trabalhadores que, em sua maioria, ganham pouco mais que um salário mínimo. Pois é, policiais, bombeiros se transformaram em milícia e controlam acesso à TV, entrada de gás e até correspondência nas favelas. Sem contar os assaltos, furtos e violência. Não bastasse tudo isso, minha crítica é justamente ao prefeito e ao governo do Estado que implementam e ratificam tal política. E não posso também deixar de criticar as Olimpíadas, porque o preço pode ser muito caro... O governador e o prefeito estão murando as favelas, ocupando as comunidades a qualquer preço, leia-se: morte de crianças, trabalhadoras e trabalhadores. E o processo de higienização é muito sério. Trabalho na Cinelândia e vejo quase todos os dias trabalhadores informais e sem teto apanharem de policiais nas ruas e quando são levados nunca se sabe para onde... Essa é minha indignação. Sabe, antes de mudar para o Rio, sabia que a situação era difícil, muita violência, mas morando aqui presencio uma situação quase surreal. Porque é difícil de acreditar em tais políticas implementadas e em tamanha repressão e isolamento aos mais pobres. E a minha crítica vem daí. Não posso tolerar o autoritarismo de uma política voltada para os mais ricos. E para conquistar as Olimpíadas quem está pagando o preço aqui é o povo pobre do Rio de Janeiro. Sinceramente, concordo com você e não tenho o menor problema em dizer isso que o governo Lula realmente levantou a autoestima dos brasileiros e atingiu uma força histórica na América Latina. Tiro o chapéu para o apoio de Lula ao Zelaya. Fantástico! Mas não posso aceitar companheiros de favelas apanhando por aí... A que preço veio essa conquista? Tomara que realmente melhore a infraestrutura, mas por enquanto o transporte, por exemplo, ampliação até a Barra da Tijuca, enquanto isso trabalhadores são chicoteados nos trens precários da Supervia. Ontem, recebi um e-mail de uma companheira com quem fiz um trabalho de comunicação popular e ela está muito assustada. Uma senhora que está prestes a ser removida. Ela mora em uma comunidade na Barra da Tijuca e já anunciaram a remoção de todas essas famílias, devido às Olimpíadas. E isso não é achismo meu ou extremismo, são fatos estampados nos jornais. Essa política de remoção é vista com bons olhos pela sociedade... E para onde vão essas famílias? Pois é, não têm para onde ir... Por isso e muito mais, minha crítica não é nada partidária, é uma crítica que vai além da militância, uma crítica de um ser humano indignado com a atual política carioca. Não admito que fechem os olhos diante de toda essa barbárie que acontece no Rio de Janeiro. É quase um extermínio de pobres. Sabe o que mais me dói? Subir uma favela e ouvir de uma criança que fulano de tal foi morto pela polícia essa semana. É uma naturalidade inexplicável... E quando assisto ao vídeo da candidatura do RJ, me pergunto sim: Olimpíadas para quem? O vídeo só ratifica a atual política implementada por Sérgio Cabral e Eduardo Paes... E posso te afirmar, o objetivo desses caras é realmente acabar com as favelas, custe o que custar, sem qualquer política de moradia popular... apenas extermínio... Minha crítica vem daí e não direcionada por linhas partidárias. Minha crítica vem do dia a dia, dos relatos e dos fatos. E quando vc afirma que é partidária, praticamente, desqualifica meu posicionamento de militante... mas tudo bem, espero que tenha contribuído para o debate! beijão
Opa! Belo debate!
Concordo com tudo o que você expôs. Tenho conversado muito com meus amigos cariocas sobre esse "choque de ordem" que visa, entre outros absurdos, "remover as favelas". Esta é uma medida deplorável e fascista. Acho que o pior que poderia acontecer ao Rio de Janeiro era ter Sergio Cabral e Eduardo Paes como seus governantes. Porém, esta política de higienização não vem de hoje e não foi motivada pelas Olimpíadas. Ela poderá, é claro, tomar proporções maiores conforme a abertura do evento for se aproximando, mas não creio que ela tenha nascido como consequência disto. Há que se fazer uma vigilância incansável sobre a aplicação dos recursos que irão chegar. Há que se combater as medidas totalitárias que a dupla Cabral-Paes está promovendo. Há que se lutar - sempre - para eleger companheiros compromissados com a população pobre do Rio. Mas também há que se tomar cuidado para não confundir o combate às políticas locais ou partidárias com o combate aos interesses nacionais. Estes devem estar acima de tudo. Nem sempre um evento (como no caso das Olimpíadas) pode ser responsável pela solução ou pela denúncia de todos os nossos problemas. Na minha opinião, ele é a chance de nos redimirmos com a história. É também uma vitória política, como a volta de Zelaya ao poder de Honduras (questão de tempo), o pré-sal e a incontestável redução da pobreza lograda pelo governo Lula. Há muito a ser feito? Sem dúvida, há muita coisa para ser resolvida. Mas temos de nos manter otimistas e atentos para não cairmos no jogo daqueles que querem, por inúmeras razões, reacender o nosso secular complexo de inferioridade. Beijão!
Camila sua avaliação está correta mas é minoritária na população em geral. Não existe qualquer dúvida que a propaganda das Olimpiadas garantiu apoio da maioria da população que usando do senso comum vislumbra vantagens na realização desta competição no Rio. O bom senso sempre clama olhar para o que ficou de "legado social" do Pan para ver o que espera o Rio de Janeiro. A resposta a essa questão depende de quanto comprometidos somos com uma visão critica da realidade ou não. Muitos inclusive concordam com a afirmação reveladora do Lula de que "conquistamos a cidadania mundial..." devido as Olimpiadas... Cidadania sem justiça social? Cidadania sem serviços públicos de qualidade? Sim pois para muitos, não apenas o Lula no poder e exatamente por isso que ele continue com bom apoio popular, a cidadania deve seguir limitada. Devemos entender que combatemos contra o senso comum majoritário e que receberemos muito mais criticas quanto maior o alcance das nossas posições. Exatamente por isso somos necessários Camila. Beijos, Sérgio
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