“Bolsonaro diz que PSOL é partido de pirocas e ‘veados’”. Este foi o título da matéria de muitos veículos de comunicação desta quinta-feira, dia 19. Uma atrás da outra, justamente na semana em que comemoramos o dia internacional de luta contra a homofobia (17 de maio). Então, digo a esse certo indivíduo o seguinte: se lutar pela igualdade de direitos significa ser “veado”, então eu sou “veado”. Lutar pela livre orientação sexual significa ser “veado”, então eu sou “veado”. Acreditar no amor entre duas pessoas, independentemente de sexo, significa ser “veado”, então eu sou “veado”. Lutar contra todo e qualquer tipo de opressão significa ser “veado”, então eu sou “veado”. Acreditar que este tipo de manifestação preconceituosa só induz à violência e não contribui em nada para um mundo melhor significa ser “veado”, então eu sou “veado”. Acreditar na verdadeira democracia livre de desigualdades sociais significa ser “veado”, então eu sou “veado”. Acreditar que o respeito é possível significa ser “veado”, então eu sou “veado”.
E digo mais: sou “veado” e com i maiúsculo!
Se você acredita nesses princípios básicos por um mundo melhor, justo e VERDADEIRAMENTE solidário, entregue-se a essa tal “veadagem”. Direitos são iguais e devem ser respeitados! Chega de homofobia!
quinta-feira, 19 de maio de 2011
segunda-feira, 16 de maio de 2011
inexplicável
16/05/2011
Inexplicavelmente
atenta
desatenta
corpo cão
em vão
mente insana
vida mundana
trilho vai e não vem
a luz se apagou
e o túnel desmorou
Inexplicavelmente
atenta
desatenta
corpo cão
em vão
mente insana
vida mundana
trilho vai e não vem
a luz se apagou
e o túnel desmorou
domingo, 8 de maio de 2011
Miss Alteridade
08/05/2011
Há anos convivia com essa estranha suspeita. Tão transversal que corria pelo corpo lhe sangrando a cada dia. Não tinha como rejeitar, mas podia ignorar, embora sua presença lhe fosse constante. Era sua irmã, sua amante, sua mãe. Era aquilo que lhe movia. Não sabia ao certo o porquê ou para quê, mas aquela raiz cumpria todos os seus sentidos: fazia apodrecer e também amadurecer. Chamavam-lhe de louca, imatura, desequilibrada e até a ameaçavam, mas não conseguia livrar-se dessa companhia maldita. Lhe destinavam a solidão, o isolamento e até o escárnio, este era o que mais lhe doía. O sarcasmo alheio lhe matava aos poucos. Sentia-se incompreendida e encontrava em si o melhor casulo. Não atendia mais aos telefonemas, tinha pavor de longas conversas; evitava saídas; ignorava encontros; tinha inveja da felicidade gratuita das pessoas. Afinal, sua felicidade lhe custava muito caro: a quase abdicação de seu Ser, sentia que a tristeza lhe era natural. Assumia sua parceria inefável em uma relação quase incestuosa de si mesma. De tantas e tantas crises, aprendeu a enxergar o momento exato dessa linha tênue entre sanidade e loucura. Sabia que ao seu lado estava o abismo, e ela tão oblíqua fazia pontas nos pés e observava desejosa esse fundo. Era sua cova, a realização de sua covardia em realidade. Muitas vezes caía. Caía tão profundamente que nada mais lhe fazia sentido. Nada era importante, a não ser sua mais egoísta dor. Sim! Sabia que essa dor era egoísta ou foi muito bem convencida pelo mundo de que toda essa angústia tratava-se de egocentrismo diante dos problemas globais. Mas não. Era apenas uma menina assustada, dividida entre o medo e a constante agonia. Não tinha culpa por aquilo que sentia. Tentava manter-se firme, apenas observar de longe esse buraco sedutor. Tentava os remédios, o álcool, os amigos, a literatura, a religião e até voltava a ter esperança. Mas a melancolia era sua estranha suspeita em repetição, sua irmã, sua amante, sua mãe, sua essência. Nada que fizesse podia arrancá-la. Tentava administrá-la, mas a incompreensão sangrava seu ser. Não podia mais. E em seu sadismo mais maquiavélico,a melancolia lhe apresentava um ménage a trois e sua próxima parceira era a depressão. Surtava, jogava bolsas para o alto, celulares voavam, chorava compulsivamente pelas ruas, escondia-se na escuridão do quarto, desligava os telefones e rendia-se aos programas dominicais, nem mesmo a inspiração lhe era bem-vinda. E quando a esperança tomava de súbito seu coração, pedia: alteridade, por favor, alteridade.
Há anos convivia com essa estranha suspeita. Tão transversal que corria pelo corpo lhe sangrando a cada dia. Não tinha como rejeitar, mas podia ignorar, embora sua presença lhe fosse constante. Era sua irmã, sua amante, sua mãe. Era aquilo que lhe movia. Não sabia ao certo o porquê ou para quê, mas aquela raiz cumpria todos os seus sentidos: fazia apodrecer e também amadurecer. Chamavam-lhe de louca, imatura, desequilibrada e até a ameaçavam, mas não conseguia livrar-se dessa companhia maldita. Lhe destinavam a solidão, o isolamento e até o escárnio, este era o que mais lhe doía. O sarcasmo alheio lhe matava aos poucos. Sentia-se incompreendida e encontrava em si o melhor casulo. Não atendia mais aos telefonemas, tinha pavor de longas conversas; evitava saídas; ignorava encontros; tinha inveja da felicidade gratuita das pessoas. Afinal, sua felicidade lhe custava muito caro: a quase abdicação de seu Ser, sentia que a tristeza lhe era natural. Assumia sua parceria inefável em uma relação quase incestuosa de si mesma. De tantas e tantas crises, aprendeu a enxergar o momento exato dessa linha tênue entre sanidade e loucura. Sabia que ao seu lado estava o abismo, e ela tão oblíqua fazia pontas nos pés e observava desejosa esse fundo. Era sua cova, a realização de sua covardia em realidade. Muitas vezes caía. Caía tão profundamente que nada mais lhe fazia sentido. Nada era importante, a não ser sua mais egoísta dor. Sim! Sabia que essa dor era egoísta ou foi muito bem convencida pelo mundo de que toda essa angústia tratava-se de egocentrismo diante dos problemas globais. Mas não. Era apenas uma menina assustada, dividida entre o medo e a constante agonia. Não tinha culpa por aquilo que sentia. Tentava manter-se firme, apenas observar de longe esse buraco sedutor. Tentava os remédios, o álcool, os amigos, a literatura, a religião e até voltava a ter esperança. Mas a melancolia era sua estranha suspeita em repetição, sua irmã, sua amante, sua mãe, sua essência. Nada que fizesse podia arrancá-la. Tentava administrá-la, mas a incompreensão sangrava seu ser. Não podia mais. E em seu sadismo mais maquiavélico,a melancolia lhe apresentava um ménage a trois e sua próxima parceira era a depressão. Surtava, jogava bolsas para o alto, celulares voavam, chorava compulsivamente pelas ruas, escondia-se na escuridão do quarto, desligava os telefones e rendia-se aos programas dominicais, nem mesmo a inspiração lhe era bem-vinda. E quando a esperança tomava de súbito seu coração, pedia: alteridade, por favor, alteridade.
quarta-feira, 4 de maio de 2011
Os filhos do abandono
Os filhos do abandono
04/05/2011
Ato I
Tinha dez anos e brincava com um saco de arroz desenhado como se fosse boneca. Mas tinha tempo contado, pois esse arroz era o único do mês, por isso, não tinha muito tempo para brincar. Aprendeu cedo a cozinhar, tinha os dedos infantis queimados no alho e óleo. Muitas vezes, só óleo. Dois anos depois estava quase saindo da 6ª série e tinha fascínio por triturar as coisas. Triturava o lápis, o batom, o alho, a borracha e, enfim, o giz. A professora não entendia porque sua caixa de giz sempre estava vazia e ela com as marcas em sua mochila vermelha. Cheirava o giz, tal qual pai e mãe. Aprendia. A imitação era seu melhor presente.
Ato II
Sempre sonhava com a pipoca da esquina. Seu pai nunca tinha dinheiro para lanche extra, mal tinha para o sapato surrado. Era aquele que fazia bicos esporadicamente, enquanto a mulher tomava conta dos cinco filhos. E o menino ainda sonhava. Pipoca doce com leite condensado. Pipoca salgada com queijo e bacon. Sonhava com a pipoca e sempre cabisbaixo pelas esquinas da escola. E no tão sonhado dia das crianças no qual as pobres nada ganham, a não ser a caridade e o desejo estimulado pelo consumismo de mercado, ele ganhou uma pipoca do seu Zé da esquina. Tinha quase 14 anos. Quase um homenzinho e sonhava com aquela pipoca. Comeu daqueles sacos grandes com bastante queijo e no final uma surpresa. Seu Zé fora generoso. Nunca imaginara tamanha bondade. Não jogou o saco fora e deixou para abrir em casa. Deliciou-se. Mal dormiu de tanta satisfação. (Eu, sinceramente, caro leitor, lembro-me da sensação do conto de Clarice Lispector intitulado Felicidade Clandestina). No dia seguinte, seu Zé, muito sorridente chamou o garoto e perguntou se ele havia gostado do presente. Assentiu com a cabeça. E seu Zé denunciou: “Vai ter que me pagar garoto, presentinho não é de graça não. Pode tratar de vender essa trouxinha de pó aqui na escola e bem rapidinho. Vai ter que fazer valer seu nariz feliz ai”. Foi assim que as manchetes de jornal começaram.
Ato III
“Pixaim, tribufu de carvão”, era como era chamada na escola desde cedo, além de muitos outros apelidos. Até alguns professores zombavam de seu cabelo. Sempre pensava que tinha namoradinhos, mas eles (literalmente) lhe chutavam a bunda ou a faziam pegar em suas partes íntimas fazendo ser uma brincadeira inocente, mas ao final da aula lá estava ela com a mão embaixo da mesa de algum menino. O mesmo que, mais tarde, lhe chutaria a bunda, lhe xingaria e até tentaria pôr fogo em seus cabelos. Sim, era negra. Era negra como muitas, mas não se arrumava ou se entendia como periguete do bairro. Todos os dias sentava na calçada da escola e chorava. Chorava muito até perder o fôlego. Um dia, se ergueu. Se ergueu tanto que começaram a lhe pagar pelo programa. Tinha apenas 12 anos e já tinha agenda marcada após a escola. Quem era o pixaim?
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